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Larissa Oliveira
Sergipana e professora bilíngue, admira os mais diversos tipos de arte e já teve seu momento Twin Peaks, além de epifania ao ler o romance que dá nome a este blog, A Redoma de Vidro de Sylvia Plath. Este Blog nasceu em 2014 e é dedicado a críticas de filmes, livros, séries e música, sendo que as dos três primeiros contêm spoilers. Boa leitura!

Anne Sexton e Sylvia Plath e a relação com seus pais



 
Da esquerda à direita: Anne Sexton e Sylvia Plath


Aproveitando que nesse último domingo foi o dia dos pais, tive uma enorme ânsia de correlacionar duas poetas (poetas porque sim!) que escreveram sobre a presença paterna em suas respectivas visões. Estou falando de Sylvia Plath e Anne Sexton. Ambas vivenciaram experiências semelhantes em relação à depressão, abordando em suas obras, temas como estereótipos femininos, suicídio, e família, postos em suas poesias confessionais. Com tantas temáticas em comum, quando se conheceram em 1958, durante um seminário, logo se tornaram grandes amigas. Nesse forte laço que criaram juntas, a questão da morte era muito debatida em suas conversas; questão que teve fruto inicialmente na relação conturbada com seus pais.

Anne Sexton, depois de algumas tentativas de suicídio, foi aconselhada pelo seu terapeuta a transformar seus conflitos internos em poemas. Entre eles, ''All my pretty ones '' algo como "Todos os meus queridos" (tradução própria) de (1962), retirado do livro de mesmo título, traz a angústia da perda do seu pai meses após a da mãe.
A poeta faz um contraste entre os triunfos e fracassos da vida dele. Porém, acima de tudo, a poeta o perdoa: ''Whether you are pretty or not,  I outlive you /bend down my strange face to yours and forgive you ''// ''Se você é bonito ou não, eu sobrevivo a você/ curvo para baixo meu rosto estranho perante ao seu e te perdoo''.
 Há algumas fontes que apontam a relação entre Anne e seu pai como distante. No poema, nota-se a retomada da infância no objetivo de compreender essa distância e finalmente adulta, estar pronta para perdoar. Coisa que ela nunca pode fazer na vida real e que a martirizava. 
Poucos dos seus escritos foram traduzidos para o português. Tentei fazer a minha tradução livre para a primeira estrofe do  poema citado inicialmente acima:

Father, this year’s jinx rides us apart
where you followed our mother to her cold slumber;
a second shock boiling its stone to your heart,
leaving me here to shuffle and disencumber
you from the residence you could not afford:
a gold key, your half of a woolen mill,
twenty suits from Dunne’s, an English Ford,
the love and legal verbiage of another will,
boxes of pictures of people I do not know.
I touch their cardboard faces. They must go.

Pai, a má sorte deste ano nos separa
onde você seguiu nossa mãe para o seu sono frio;
um segundo choque ferve sua pedra para o seu coração,
me deixando aqui para embaralhar e desembaraçar
você da residência que não podia pagar:
uma chave de ouro, sua metade da fábrica de lã,
vinte ternos da Dunne's, um Ford inglês,
o amor e o palavreado legal de outra vontade,
caixas de fotos de pessoas que eu não conheço.
Eu toco seus rostos de papelão.Eles devem ir.

 Você pode acessar o poema (em inglês) na íntegra  Aqui

                                                 

   
   A visão da infância é também relatada no poema ''Paizinho ''(Daddy) de Sylvia Plath. A poeta é transtornada pela imagem do pai, não quer perdoá-lo, quer esquecê-lo, comparando-o metaforicamente a um nazista  (autoritário, arrogante). Ela foi uma garota duas vezes angustiada. Quis dizer que ela casou-se com um homem tão destrutivo quanto o pai : ''Fiz um modelo de ti,/Homem de preto, com um aspecto de Meinkampf'''. A própria Sylvia cita antes de cometer suicídio que sofreu um ''Complexo de Electra''. Ela o via como um Deus intocável, e essa imagem icônica dele,  a  perseguia e  a reprimia.
 Enquanto Anne cresceu e entendeu o efeito que a imagem de seu pai tinha sobre ela, sentindo compaixão, Sylvia sentiu desprezo. Ambas poetas cometeram suicídio, deixando seus legados atemporais.O abandono e a angústia das figuras que elas tanto veneravam, foram pontuadas profundamente nesses dois poemas. Não há como em um verso ou outro não se encontrar ou comover-se.


                                                                   
   
   Paizinho

Não serves, não serves,
Não serves mais, sapato preto
Em que eu vivi como um pé
Trinta anos, pobre e branca,
Mal me atrevendo a respirar ou atchim.

Paizinho, eu tive de matar-te,
Morreste antes que eu tivesse tempo,
Mármore pesado, saco repleto de Deus,
Estátua medonha de dedo grande cinzento
Do tamanho de uma foca de Frisco

E uma cabeça no Atlântico mais esquisito
Onde ele derrama o verde-feijão sobre o azul
Nas águas da lindíssima Nauset.
Eu costumava rezar para te recuperar
Ach, du.

Na língua alemã, na vila polaca
Aterradas pelo rolo
Das guerras, guerras, guerras.
Mas o nome do lugar é vulgar.
Diz o meu amigo polaco

Que há uma ou duas dúzias.
Assim nunca soube onde tu
Fixaste os pés, as tuas raízes,
Contigo nunca consegui falar.
A língua presa no maxilar.

Arame farpado.
Ich, ich, ich, ich,
Mal conseguia dizer.
Em qualquer alemão estavas espelhado.

E a linguagem porca
Uma máquina, uma máquina
Em vapores leva-me como judia.
Uma judia para Dachau, Auschwtiz, Belsen.
Comecei a falar como uma Judia.
Acho que é boa ideia ser Judia.

A neve do Tirol, as cervejas clarinhas de Viena
Não são muito puras ou genuínas
Com a minha angelical cigana, o meu destino estranho
E as minhas cartas de tarot, cartas de tarot
Eu posso ser um pouco Judia.

Sempre me provocaste medo,
Com a tua Luftwaffe, a tua conversa vazia.
E o teu bigode lavado
O olho ariano, muito azul.
Homem-panzer, homem-panzer, oh tu_

Não Deus, mas uma suástica.
Tão negra que nem céu.
Qualquer mulher adora um Fascista,
A bota na cara, o bruto
Bruto coração de um bruto da tua espécie.

Estás de pé na pedra, paizinho,
Na imagem que trago comigo,
Em vez do pé, o queixo partido,
Não menos canalha por isso, oh não
o homem que partiu em dois
o meu lindo e vermelho coração.

Eu tinha dez anos quando foi a enterrar.
Aos vinte anos, eu tentei morrer
E voltar, voltar, voltar para ti.
E até pensei que os ossos serviriam.

Mas não me deixaram,
Juntaram os meus bocados com cola.
E então eu soube o que fazer.
Fiz um modelo de ti,
Homem de preto, com um aspecto de Meinkampf

E o amor de tortura e torniquete.
E eu disse eu aceito, eu aceito
E então, paizinho, finalmente estou acabada.
Arranquei o telefone preto da ficha,
As vozes já não se arrastam até aqui.

Se matei um homem, matei dois_
O vampiro que me disse seres tu
E bebeu o meu sangue por um ano,
Sete anos, se queres saber
Paizinho, podes voltar para trás.

Há uma estaca no teu coração negro e gordo
E os homens da vila nunca gostaram de ti.
Eles dançam e espezinham-te.
Eles sempre souberam que eras tu.
Paizinho, paizinho, seu canalha, estou acabada
.
(Tradução retirada do blog sylviabeirute)









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