Crítica: Utopia e Barbárie (2009)

Semana passada assisti ao documentário Utopia e Barbárie produzido por Silvio Tendler e que conta como as dualidades utopia e barbárie caminham juntas ao longo da História. Mais especificamente nos últimos 70 anos, em que tantos ideais provam essa tese. A obra se inicia com o lançamento da bomba atômica em Hiroshima (1945) o que parecia ser o estopim de uma série de revoluções em seguida. Lembrando que esta era foi composta pela disputa entre o capitalismo e socialismo: De um lado o imperialismo norte-americano parecia aterrorizar, de outro o socialismo servia como pano de fundo para uma sociedade utópica. Pois bem, é justamente esse quadro que é apresentado por esse diretor de alguns documentários premiados relacionados às transformações políticas ao redor do mundo. Se conhecemos os fatos quando os estudamos na escola, aqui os recursos empregados oferecem ao espectador um lugar de desconforto e reflexão sobre os efeitos do ontem para o hoje. As distorções nos sons e imagens são diferentes das que estamos acostumados a ver em outros documentários. Os intertítulos servem como definições exemplares para a palavra utopia.
Quando o Vietnã esteve em guerra, a paz foi cantada e posta como a utopia desse tempo, sendo que o autor tratou dessa como concreta pois, vence a barbárie imposta pelo poderio norte-americano. O contraste segue quando Fidel Castro ocupa o poder em Cubano fim dos anos 50, derrotando outra tentativa de imperialismo. O autor relata como a imagem de guerreiro que tanto Fidel quanto Che Guevara carregava, simboliza a busca pelo mesmo tipo de representante ainda hoje. Outra imagem ilustre é a do líder responsável pela revolução cultural chinesa, Mao Tsé-Tung. O ponto mais forte da obra se encontra nos tempos de ditadura aqui na América Latina. Se tudo parecia bem com os governos socialistas até então, as ditaduras rompem o processo de utopia e instalam a barbárie. Tendler utiliza exemplos de filmes que retratam a resistência do homem em relação à política opressiva. Roma, Cidade Aberta de Roberto Rossellini, representa isso nos tempos de ditadura nazista, mas a barbárie não mudaria nesse novo contexto. No Brasil, mais do que um resumo sobre nossos anos de chumbo, o autor coleta depoimentos de sobreviventes das torturas. Na época do documentário, a economista do Governo Lula, Dilma Rousseff, que vivenciou torturas, afirma que se há um lado positivo da ditadura é que mostra que os ativistas estavam lutando por um ideal.
A obra também se destaca ao contar com opiniões de diversos intelectuais como cineastas, escritores e jornalistas. No Chile, a ditadura de Pinochet não se faz por menos cruel. A utopia entra então em cena novamente com as várias tentativas de combater esse tipo de barbárie. 1968, então, é descrito na obra como o ano mais orgásmico da História. Uma série de revoluções ao redor do mundo se compilam no sonho de liberdade. Os Sonhadores (2003) de Bernardo Bertolucci é um bom filme para entender como isso se deu no contexto da França. A década de 80 vem com surpresas: um passo para a utopia é dado no Brasil, e outro no Chile. As pessoas vão às ruas e protestam contra ditaduras que se desgastam. O famoso episódio do ''NO'' no Chile é ilustrado em um filme espetacular com a atuação do mexicano Gael García. É com a queda do muro de Berlim em 1989 que o cineasta se dá por satisfeito dos registros que vem captando para montar seu documentário, mas engana-se .Na década de 90, a utopia se fragmenta em lutas menores em um novo advento durante o fim do século XX e novo milênio: a globalização. Os protestos ambientais em Seattle, as disputas entre Israel e Palestina, a presidência de um negro nos Estados Unidos, etc.
O novo advento não exclui os efeitos das tantas utopias anteriores: como explicar a estreita relação ocorrida entre o Governo capitalista de Obama e o anti-imperialista Hugo Chávez?. O documentário de 2 horas não foi suficiente para juntar todos os fatos importantes associados à dualidade proposta. Há muito mais do que foi representado e ainda haverá enquanto nos fizermos humanos .Ainda protestamos em busca de algo que não sabemos definir, ou quando achamos que sabemos, nomeamos como liberdade. Para Tendler, não há um só tipo de utopia. No seu fim, um escritor diz que estamos presenciando a distopia, ou seja, o contrário da utopia. Se realmente estamos vivendo esse processo ou não, é importante lembrar que a utopia sempre movimenta e inspira o homem; termino este post com um dos intertítulos utilizados por Tendler, ''O sonho ainda não acabou''. Confira abaixo:
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