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Larissa Oliveira
Sergipana e professora bilíngue, admira os mais diversos tipos de arte e já teve seu momento Twin Peaks, além de epifania ao ler o romance que dá nome a este blog, A Redoma de Vidro de Sylvia Plath. Este Blog nasceu em 2014 e é dedicado a críticas de filmes, livros, séries e música, sendo que as dos três primeiros contêm spoilers. Boa leitura!

Crítica: Mysterious Skin (2004)




A trilogia do apocalipse adolescente de Gregg Araki lançada em meados dos anos 90 retratava jovens, geralmente homossexuais, entediados que buscavam no sexo, drogas e rock industrial uma escapatória. Essa trilogia consagrou o diretor como cult, mas foi massacrada pela crítica que a viu como fútil. No entanto, anos mais tarde, Araki busca atrair um público jovem novamente, dessa vez tratando de temas como a sexualidade com mais seriedade. Em Mysterious Skin, o diretor ainda tem uma pegada meio apocalíptica, usando uma teoria alienígena por exemplo, só que a emprega com um sentido bem mais sensível do que nos seus outros filmes.
A história se inicia com o relato de um acontecimento narrado por duas visões distintas. Para Brian, as memórias daquela noite não são muito claras. Ele tinha 8 anos e só lembra do instante em que o jogo de beisebol acaba e quando acorda na entrada de sua casa com um sangramento nasal. Nesse intervalo, Brian acredita ter sido abduzido, já que tinha uma imagem turva de um ser estranho tocando o seu corpo, o que explicaria o seu sangramento.
Somos convencidos dessa versão até temos o relato brutal e realístico do que realmente ocorreu  de acordo com outro personagem chamado Neil. Ele e Brian treinavam beisebol juntos com o mesmo treinador. Na noite após o término da partida, ele leva os garotos para a sua casa. Neil, com a mesma idade de Brian, já sabia o que aconteceria ali. Sua mãe Ellen estava sempre acompanhada por vários namorados, o que levou Neil a sua descoberta sexual ainda na infância. Ressaltando que seu primeiro contato com o treinador não foi o que o tornou homossexual, para Neil aquilo era uma ingênua iniciação sexual. Atraindo Neil com brinquedos e carícias, ele o molesta. A intenção do diretor foi causar repulsa a esse ato. As cenas não são explicitas, obviamente, porém, o modo como o agressor age anteriormente já é suficiente para causar um desconforto.


Neil se torna um garoto de programa aos 15 anos, mostrando-se indiferente aos perigos que o submundo oferece. Sua melhor amiga Wendy, descreve seu coração como um buraco negro. Ela sabe que Neil precisa de ajuda e o convida para passar um tempo com ela em nova Iorque para arrumar um emprego. Enquanto isso, obcecado com teorias alienígenas, Brian conhece uma garota chamada Avalyn por meio de um programa de TV, alegando que também foi abduzida. A conexão entre os dois acaba quando ela tenta transar com ele. Brian é um adolescente retraído demais para ter um contato físico com alguém. Até que um dia, encontra uma foto do antigo time de beisebol e reconhece Neil na foto. Acreditando que ele também foi abduzido naquela mesma noite, vai em sua busca. Neil fica sabendo sobre Brian ainda em Nova Iorque por meio de seu amigo Eric e decide voltar para casa.
Neil arranja carona com um homem que o estupra. Mais uma vez o diretor tem a intenção de causar horror. Araki foi preciso em distinguir uma relação homossexual normal e um abuso. A violação não tornou Brian gay. A impressão que temos é de que ele é assexuado. Joseph Gordon-Levitt sabia do peso que seu papel lhe proporcionaria, mas não desaponta. A maior preocupação de um jovem nos filmes anteriores de Araki era se o mundo acabaria  a qualquer instante. Nesse, a de Neil era se ele conseguiria permanecer vivo para retornar à casa.
No reencontro dos dois, Neil o leva para a casa do treinador a fim de acertar as contas. Brian reconhece a luz azul na frente da residência, mas as coisas só se encaixam plenamente quando adentram a casa e sem encontrar o treinador, Neil resolve contar  tudo o que ocorreu naquele dia e naquele mesmo local.


Mais angústia adolescente diz um dos letreiros do filme Totally Fucked Up de Gregg Araki. Ele também poderia ser utilizado nesse para descrever o estado de Brian após tudo ser explicado. A trilha sonora shoegaze, comum nos seus filmes, cria uma atmosfera delicada em meio à confusão mental dos rapazes. Raramente algum filme consegue retratar os danos mentais e físicos que um abuso pode causar de maneira tão sutil como em Mysterious Skin. De fato, o mundo parece estar no seu fim quando alguém tem que lidar da sua própria maneira com as consequências de um abuso. 

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