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Larissa Oliveira
Sergipana e professora bilíngue, admira os mais diversos tipos de arte e já teve seu momento Twin Peaks, além de epifania ao ler o romance que dá nome a este blog, A Redoma de Vidro de Sylvia Plath. Este Blog nasceu em 2014 e é dedicado a críticas de filmes, livros, séries e música, sendo que as dos três primeiros contêm spoilers. Boa leitura!

Crítica: A Streetcar Named Desire (1951)



O cinema norte-americano pós- segunda guerra reforça a ideia de superioridade e orgulho de ser um  cidadão estadunidense com protagonistas que reafirmam os estereótipos masculinos e femininos impostos no período. Sendo assim, peças que traziam os modelos tradicionais de figuras americanas eram adaptadas às telas. Um Bonde Chamado Desejo por Tennessee Williams retrata a moral do homem e da mulher considerando até que ponto pode se chegar ao confrontá-la. Sob a direção de Elia Kazan (Sindicato de Ladrões) o filme se torna um marco em questões de atuação e transgressão moral. Marlon Brando encarna Stanley Kowalski com tanto afinco que a extrema sexualização que seu personagem transpira o tornou um dos atores mais distintos do mundo cinematográfico. Stanley é casado com sua esposa dedicada Stella (Kim Hunter) e alega levar uma vida tranquila até a chegada da irmã de Stella, Blanche DuBois (Vivien Leigh). 
O desentendimento entre os personagens se dá na desconfiança que Stanley sente em relação à ostentação de Blanche, uma vez que ela perdeu sua propriedade recentemente. O filme se constrói a partir da batalha travada entre os dois. De um lado, Stanley representa a virilidade masculina, utilizando-se da violência física e psicológica para se impor, ao passo que Blanche se configura como a mulher que não aceita a decadência física e financeira, tentando manter uma imagem falsa perante a sociedade. 



Blanche tenta convencer sua irmã diversas vezes da sua submissão diante do abuso de Stanley. Porém, Stella reproduz o papel de dona de casa obediente e ignora os apelos da irmã. O casal que vive acima da residência dos  Kowalski também passa pela mesma rotina de brigas e perdões. A tensão do conflito entre os personagens também pode ser lida como o confronto entre o passado aristocrata e do cavalheirismo cortês, época do auge de Blanche e da força brutal e imperante que se impôs ao homem moderno na figura de Stanley. As transformações sociais ofereciam um embate à sociedade burguesa e conservadora. Por conta disso, as transgressões originalmente presentes na peça tiveram que ser expostas de maneira implícita. Em uma cena, Blanche relata a fraqueza de seu ex-marido e que sua insensibilidade diante de sua personalidade o levou ao suicídio. No entanto, o real motivo foi a descoberta de sua homossexualidade. Em outra, Blanche ameaça Stanley com uma garrafa de vidro devido à iminente violência em sua direção. Após agarrá-la, o espelho do quarto quebra-se revelando a destruição da sua integridade. Na verdade, a cena corresponde ao estupro dela, que não foi filmada. 
Acredito que o abuso era realmente desnecessário, uma vez que o argumento do autor do livro era de que o ato significava o rompimento da delicadeza de outros tempos com a brutalidade moderna, mas bem sabemos que tal argumento já se aplica claramente em outras cenas. Blanche não consegue se adaptar aos costumes da sociedade desumana e assume um papel de mulher destemida e dona de suas próprias emoções, caracterizando-se por fim, como uma personagem feminina moderna.




Não há como negar a imensidão com que Vivien Leigh se entrega à Blanche DuBois. O papel lhe trouxe um enorme peso, tendo que lidar com seu transtorno bipolar ao não conseguir se desprender da personagem. O longa é ilustre ao retratar uma mulher com tamanha complexidade. Sendo seu aprisionamento no final do filme uma demonstração do que se aguardava àquelas que ousassem sair dos padrões determinados às mulheres. O que nos faz sorrir é a liberdade de sua irmã Stella, possivelmente temporária, das garras dominadoras do homem. 
O cenário foi reajustado a fim de conferir um aspecto claustrofóbico, sendo o ambiente o reflexo do estado psicológico de Blanche.  As paredes do apartamento de Stella e Stanley eram aproximadas a cada cena, simbolizando o sufoco que as pressões exerciam em Blanche, levando-a a um colapso mental. 
A grandiosidade da obra tanto no cinema quanto em peça ainda se faz presente com diversas referências. É a inspiração por trás do filme de Woody Allen, Blue Jasmine  e de peças na Broadway. 


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