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Larissa Oliveira
Sergipana e professora bilíngue, admira os mais diversos tipos de arte e já teve seu momento Twin Peaks, além de epifania ao ler o romance que dá nome a este blog, A Redoma de Vidro de Sylvia Plath. Este Blog nasceu em 2014 e é dedicado a críticas de filmes, livros, séries e música, sendo que as dos três primeiros contêm spoilers. Boa leitura!

Crítica: Pariah (2011)




Esta semana foi marcada pela visibilidade de lésbicas e de bissexuais no Brasil. Ambas orientações ainda carregam estereótipos insultuosos que levam essas pessoas a um desencontro consigo mesmas e  ao seguinte questionamento:
 Quem serei se não posso ser eu mesma?. É a repreensão social, familiar e cultural que a protagonista do filme Pariah ,dirigido por Dee Rees, enfrenta. Dividida entre dois mundos, ela se encontra confusa, mas aos poucos, reunirá a coragem que precisa para encarar o mundo do qual não poderá se esconder. Alike (Adepero Oduye) é uma adolescente negra e de classe média. Seu pai é um policial renomado e sua mãe aparenta se submeter forçosamente a ele  a fim de agradá-lo e evitar confusões na casa. Já na primeira cena de jantar em família é possível extrair uma certa tensão. Há assuntos que são discutidos pouco a pouco até que explodam e deixem feridas abertas em todos. A adoção do vestuário masculino é uma das facetas que a personagem está vivenciando. A mensagem mais bonita que o filme transmite é a de deixar Alike ser, escolher e não restringi-la em apenas uma identidade. I am broken open, [...] Open to the possibilities within , escreve  Alike em um dos seus poemas, revelando sua sensibilidade em lidar com os desafios que virão pela frente e que poderão interferir em seu interior. 
Sua melhor amiga Laura é lésbica assumida, e por aderir roupas e comportamentos ditos socialmente como masculinos, ela sofre preconceito por parte dos pais de Alike, que suspeitam da sexualidade da filha. Porém, a diretora vai além da representação de estereótipos. Ela nos apresenta a complexidade que se insere na vida das meninas. A mãe de Laura não reconhece a filha e ela vive financeiramente instável ao lado de sua irmã. 



Alike nunca beijou antes. É somente quando se apaixona por uma garota da igreja que sua mãe frequenta, e que a obriga a ir  temendo sua homossexualidade, que a personagem terá  a chance de romper com o que vinha até então ocultando. Depois de dormirem juntas,  a garota diz que tudo foi apenas um momento divertido e que não significava nada uma vez que se afirma hétero. Alike então reconhece que não pode mais se refugiar dentro de si e precisa exteriorizar quem é, mesmo que para tal, precise ferir outros. Sua mãe já não tolera mais a indiferença do marido em relação ao estilo tomboy de Alike, além de suspeitar de traição. A tensão atinge seu limite e sendo assim, ao revelar sua sexualidade, a jovem é expulsa de casa. Rees mostra que apesar dos obstáculos que a sociedade atual ainda impõe àqueles que não se encaixam nos seus padrões, há uma ponta de esperança que os guia na busca de dignidade e aceitação. Alike não aceita conviver com sua dor. Portanto, ao decidir seguir em frente com seus estudos e suas próprias identidades, ela inspira muitos que não conseguem enxergar uma saída para lidar com as rejeições daqueles que deveriam aceitá-los. Cada dia é uma luta diferente, mas Alike sabe que por ser quem é, ela se multiplica. A dor não a consome.Ela é uma ferida aberta, mas que oferece brechas para que o amor e as novas possibilidades adentrem-na e a lembre de que é livre. É fato que a visibilidade lésbica ganhou uma voz recentemente. Sua invalidez é perpetuada por meios que alegam que essa e outras orientações são apenas fases e frutos de promiscuidade. Obras como Pariah  têm um valor importantíssimo ao humanizar as minorias oprimidas. Seu mérito também recai ao retratar uma protagonista lésbica e negra que foge à reduzida visão que se tem dessas mulheres, pois suas histórias não são as mesmas, mas se faz necessário conhecê-las e respeitá-las, numa tentativa urgente e coletiva de transformar suas vidas de párias em vidas dignas. 


Segue abaixo o poema que Alike declama no final do filme, escrito por Dee Rees e que expressa seu estado de espírito após revelar sua orientação sexual.

Heartbreak opens onto the sunrise
For even breaking is opening
And I am broken
I’m open
Broken to the new light without pushing in
Open to the possibilities within, pushing out
See the love shine in through my cracks?
See the light shine out through me?
I am broken
I am open
I am broken open
See the love light shining through me
Shining through my cracks
Through the gaps
My spirit takes journey
My spirit takes flight
Could not have risen otherwise
And I am not running
I’m choosing
Running is not a choice from the breaking
Breaking is freeing
Broken is freedom
I am not broken
I’m free.

Tradução feita por mim:

A mágoa se abre para o nascer do sol
Porque até magoar-se é abrir-se
E eu estou magoada
Eu estou aberta
Magoada para a nova luz sem impulsionar
Aberta para as possibilidades interiores,expelindo
Você vê o brilho do amor através de minhas fendas?
Você vê a luz resplandecer através de mim?
Eu estou magoada
Eu estou aberta
Eu estou magoadamente aberta
Veja a luz do amor brilhando através de mim
Brilhando através de minhas fendas
Através das lacunas
Meu espírito viaja
Meu espírito toma voo
Não poderia ascender de outro modo
E eu não estou correndo
Eu estou escolhendo
Correr não é uma escolha advinda da mágoa
Magoar-se é liberta-se
Magoar-se é liberdade
Eu não estou magoada
Eu estou livre 

Comentários

  1. Incrível a resenha deste filme. Ainda não assisti, mas agora quero muito ver. Especialmente essa poesia final, que me tocou lá nas memórias passadas, por ser lésbica também.

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    1. Espero que o filme seja uma experiência igualmente tocante, abraços e agradeço a visita !

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