Minha foto
Larissa Oliveira
Sergipana e professora bilíngue, admira os mais diversos tipos de arte e já teve seu momento Twin Peaks, além de epifania ao ler o romance que dá nome a este blog, A Redoma de Vidro de Sylvia Plath. Este Blog nasceu em 2014 e é dedicado a críticas de filmes, livros, séries e música, sendo que as dos três primeiros contêm spoilers. Boa leitura!

Crítica: Les yeux sans visage (1960)



Há três grandes obras cinematográficas de suspense em que seus protagonistas escondem suas aflições atrás de uma máscara facial. Em Abre los ojos (1997) o personagem principal, César, é extremamente narcisista e após um acidente fatal, encontra-se com o rosto desfigurado e em um fluxo espaço-temporal entre o que é real e o que é sonho. César é torturado pelo sentimento de culpa e de perda da beleza física que tanto se vangloriava. Já em La Piel que Habito (2011) um cirurgião obsessivo  confronta os limites éticos da ciência ao converter fisicamente  o 'estuprador' de sua filha em mulher, incluindo seu rosto que adquire traços femininos. O clássico do terror francês, Os Olhos Sem Rosto, do diretor Georges Franju também traz um cirurgião obcecado com experimentos a partir da pele humana. Tanto a obra de 2011 do diretor Pedro Almodóvar quanto essa trazem os principais pacientes como cobaias sem chances de reivindicar a manipulação de seus corpos. Na obra de 1960, a personagem Christiane vive em constante estado de desolação uma vez que espera há um bom tempo por um novo rosto que foi deformado após um acidente no qual seu pai assumia a direção do carro. Seu pai, o Dr. Génessier submete sua fiel ajudante Louise, a caça de mulheres com o semblante similar ao de Christiane para que a cirurgia de construção facial seja realizada. O filme apresenta uma mescla do cinema noir da fase inicial da Nouvelle Vague francesa e o expressionismo alemão, portanto seu fluxo lento e a dramaticidade presente nas imagens desconcertantes tornam o filme excepcional. 
Christiane tenta expressar seu desejo de morte por não suportar mais viver dessa maneira, mas Louise, que é extremamente leal ao cirurgião por ter reconstruído seu rosto, tenta convencê-la de que o tempo dela também vai chegar.



Depois de uma tentativa frustrada de implantar-se  uma nova face ao rosto de Christiane, Louise atrai uma nova vítima para o laboratório do cirurgião. O procedimento ocorre com sucesso, porém quando a garota sequestrada acorda e nota sua face desfigurada comete suicídio. Após certo tempo, o corpo de Christiane rejeita a nova identidade. Na obra de Almodóvar o procedimento físico é realizado com sucesso, porém a mudança exterior não acompanha o interior do personagem, ou seja, a transexualidade projetada é forçada. Ambos protagonistas encontram conflitos exteriores e interiores, uma vez que uma segunda pele lhes era implantada e porque viviam psicologicamente confinados a um mundo segundo os que performaram as cirurgias. 
Ainda assim, eles encontram  a fuga da jaula que os aprisionam como cobaias. Apesar de suas novas formas permanecerem imanentes, sua liberdade interior é a mensagem final de ambas obras. Ao dizer '' Eu sou o Vincent '' o protagonista de A Pele que Habito reafirma sua identidade interior que foi forjada a se adaptar ao padrão esperado pelo cirurgião. Já Christiane simboliza a sensação de liberdade ao abrir todas as jaulas que aprisionavam os animais usados para experimentos. Não preciso nem explicar a metáfora por trás da cena em que ela liberta várias pombas.
O longa satisfaz o espectador com o destino dos personagens principais, ao apresentar sequências marcantes, como a da remoção da face de uma vítima, e por apresentar também de forma gritante contrastes da natureza humana no seu limite: a melancolia de Christiane e a crueldade de seu pai e cirurgião Dr. Génessier. Por balancear de maneira exemplar a estética e o seguimento da narrativa numa época que vários movimentos cinematográficos afloravam, o filme se sobressai como um dos melhores resultados da junção de diferentes estilos. 





Comentários

Popular no Blog...